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Ferroeste: o desmentido de um boato e um histórico do empreendimento

“Tese” de que Dourados ficaria fora do traçado foi desmentida em reunião com ex-deputado

Por Rozembergue Marques

Um dos maiores boatos que circulou sobre a tão esperada ligação ferroviária entre Dourados e Cascavel e da cidade paranaense até o porto de Paranaguá, a Ferroeste, aconteceu em março de 2021. Dizia a “tese”, espalhada de forma até legítima (“Mateus, primeiro os teus”), que Dourados ficaria fora do traçado, preterida pela cidade de Amambai.

Como no mercado, boato tem poder, o diretor-presidente da Ferroeste, André Luís Gonçalves, esteve em Dourados especialmente para garantir ao ex-prefeito, ex-deputado federal e  ex-secretário José Elias Moreira, falecido recentemente, que a ferrovia passará pelo Porto Cambira, depois no entorno de Dourados, na região do Serrito, Aeroporto de Dourados e Cidade Universitária e seguirá a Maracaju, onde será o ‘marco zero” dessa obra de infraestrutura que deve dar um enorme ganho de eficiência na importação e exportação de produtos, tanto a granel quanto industrializados. A reunião mostrou que nunca se cogitou deixar a cidade fora do traçado, assim como não se vislumbrou, como dizia o boato espalhado aos quatro cantos, de que o traçado passaria por Amambai. Da reunião, além do presidente e diretores da Ferroeste, participou o jornalista e mais um colega de profissão.

A visita especial a Dourados tem razão de ser. O ramal da Ferroeste em Mato Grosso do Sul tem a digital de Zé Elias, que foi testemunha ocular da assinatura pelo presidente José Sarney, em 1988, do decreto que outorga a concessão para a construção e exploração de uma ferrovia a partir de Guarapuava, no Estado do Paraná, até Cascavel, também no Paraná, estendendo-se até a região de Dourados, no Estado de Mato Grosso do Sul, servindo os produtores do oeste e extremo oeste paranaense e o Mato Grosso do Sul, o Paraguai e o norte da Argentina.

Concebida principalmente para transporte de grãos agrícolas e insumos para plantio, a Ferroeste, denominada no passado de Ferrovia da Soja e Ferrovia da Produção, teve sua construção iniciada em 15 de março de 1991 pelo Governo do Paraná, em parceria com o Exército Brasileiro. O primeiro trecho implantado foi de Guarapuava até Cascavel, no Paraná, com pouco mais de 240 quilômetros. Já em dezembro de 1996, o Ministério dos Transportes autorizou a abertura definitiva do tráfego. Aconteceu a privatização da operação dessa ferrovia, num leilão em que foi vencedora a Ferrovia Paraná S.A. — FERROPAR. As atividades começaram em 1º de março de 1997. Por falta de investimentos e de cumprimento do contrato, durante 10 anos o projeto de expansão da ferrovia foi paralisado.

Em 21 de março de 2018 o então governador do Paraná Beto Richa autorizou a abertura dos estudos da nova ferrovia entre o Porto de Paranaguá e Dourados (MS) pelos consórcios: HaB; SSSE; Egis-Esteio-Copel; e STS, começando então a “tirar do papel” a luta iniciada na década de 70 por Zé Elias. Maracaju foi incluída mais tarde no projeto inicial pelo seu conhecido potencial agrícola e também pela força política e empenho do governador Reinaldo Azambuja, que é da cidade.

Ferroeste: de Campo Grande, passando por Maracaju e Dourados (MS), até o Porto de Paranaguá no Paraná. Créditos: Ferroeste e Rozembergue Marques.
Ferroeste: de Campo Grande, passando por Maracaju e Dourados (MS), até o Porto de Paranaguá no Paraná. Créditos: Ferroeste e Rozembergue Marques.

Traçar essa linha do tempo (da concessão em 1988, do início da construção em 1991 e a autorização para tráfego em 1996) referente ao primeiro trecho da rodovia no estado vizinho é necessária para que se tenha claro que, por ser um empreendimento vultoso e por conta da burocracia que envolve obras desse porte, só daqui a cerca de sete a quinze anos, segundo o presidente da Ferroeste, será concluído o ramal que ligará Maracaju a Cascavel, passando por Dourados.

Durante a reunião na residência de Zé Elias, André Luís Gonçalves assinalou que o projeto da Nova Ferroeste tem importância estratégica para o País e foi qualificado como prioritário no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), do governo federal. “A inclusão garante celeridade na articulação com as entidades intervenientes, aquelas que acabam envolvidas nos processos de licenciamento, como o Ibama, a Funai, o ICMBio e Incra”, pontuou. “Os estudos levam em conta todas essas variantes, e estão sendo elaborados para ter o menor impacto possível em comunidades indígenas, quilombolas, assentamentos e unidades de preservação. Outra preocupação é com as áreas urbanas, evitando trechos que cruzam as cidades”, enumerou, lembrando que aqui em Mato Grosso do Sul esses entraves são poucos.

Sobre outro boato “acoplado” ao boato de que Dourados ficaria de fora do traçado (o de que a cidade não teria terminais) o presidente da Ferroeste foi claro ao dizer que os terminais serão implantados mediante estudos de viabilidade e demanda. Sendo esse o critério, os números tranquilizam quanto a que certamente Dourados deve receber um terminal: Mato Grosso do Sul atingiu a marca histórica de 15 milhões de toneladas do grão na safra 2022/2023. Em Dourados foram 225.000 hectares de área plantada, com uma produção estimada em 774.000 toneladas. Se somar a esses números as safras dos municípios da qual a cidade é polo, há muita carga na cidade e ao seu entorno a ser transportada pela futura rodovia. Na reunião Zé Elias lembrou inclusive que a prefeitura possui uma área próxima ao aeroporto que, eventualmente, pode abrigar um terminal.

Espécie de “embaixador” da cidade nos assuntos ligados à ferrovia e interlocutor direto do governador Ratinho Júnior e dos diretores da Ferroeste, à época Zé Elias se emocionou ao lembrar ao jornalista esta e outras lutas que tem encampado, mesmo sem mandato: “Tenho com Dourados a relação de um pai para com um filho. A gente muda, eles crescem e nós nunca deixamos de amá-los e de cuidar. Estou muito feliz e a luta continua. Vamos ter a ferrovia e espero a união de todos, incluindo a Câmara Municipal e a atual gestão da prefeitura, para que todos os entraves sejam sanados com a maior brevidade e agilidade possível”. Zé Elias não teve tempo para ver os trens da Ferroeste passarem ao lado da cidade da qual foi prefeito e representou na Câmara dos Deputados. Mas, como mostra esse breve histórico, foi umas das peças-chave para que ela esteja saindo do papel.

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