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Referência na luta contra maus-tratos e abuso infantil, Sargento alerta para denúncias e comportamento

Para a Sargento Betânia, o padrasto acusado de agredir e abusar sexualmente do enteado, de 3 anos, já deveria estar preso

Por Victoria Bissaco/MS Ativo

Campo Grande foi cenário de mais um crime chocante de maus-tratos infantis. Conforme noticiado anteriormente, uma avó, moradora do Jardim Noroeste, pede agilidade à Justiça para prender o padrasto do neto dela, de 3 anos. O menino foi submetido a sessões de agressões e molestamento que resultaram em sequelas graves. A sargento Betânia, nome de peso na luta contra abuso sexual e maus-tratos infantis no Estado, comentou o caso.

“A avó desesperada nos procurou. No primeiro momento, havia a suspeita de que a criança estava sendo molestada, agredida. Então, procurou a Delegacia e o Conselho Tutelar. Foi dada uma segunda chance para que a mãe ficasse com a criança. Retornou para o convívio da mãe e aumentaram os maus-tratos. Chegou ao ponto de ter fraturado o braço da criança, que foi conduzida até a Santa Casa. No hospital foi identificado que ela estava com um coágulo no cérebro, ou seja, as agressões iam muito além. O menino também foi abusado sexualmente”, conta.

Os maus-tratos levaram a uma hidrocefalia e deficiências motoras. “Outro agravante para o caso é que o agressor dessa criança está solto. É uma falha. É aí, que eu falo que a rede de proteção apresenta falhas, porque a partir do momento que o Conselho Tutelar identificou que houve agressão, chegou até a Delegacia, a qual também constatou que essa criança quase perdeu a sua vida, O que justifica esse abusador ainda estar solto?”, questiona.

Ao MS Ativo, a avó materna do menino explicou que conseguiu a guarda do menor. Porém, cinco meses após denunciar o agressor, a Justiça ainda não tomou as devidas providências. “Infelizmente a mãe e o padrasto moram a menos de 500 metros da minha residência”, contou a avó. A sargento Betânia explica que a avó chegou a denunciar ameaças do padrasto à Polícia Civil, que orientou para que ela procurasse a Defensoria Pública.

“No meu entendimento, vejo que, a partir do momento em que foi identificada dentro da delegacia a reincidência desse acusado, tinha que ter sido pedido sim a prisão preventiva. Eu tenho certeza que o Judiciário, a Vara Especializada de combate à violência contra a criança e ao adolescente teria acatado o pedido”, acredita.

Com 15 na Segurança Pública de MS, Sargento Betânia aponta fatores de risco. Foto: Bruno BarrosBarros

Fatores de risco

A sargento Betânia explica que alguns fatores podem contribuir para a ocorrência de maus-tratos, como, por exemplo, relacionamentos com desconhecidos ou homens com passagens criminais, em especial com cometimento de agressão ou abuso sexual. “Se a mulher constitui um novo relacionamento com uma pessoa que ela mal conhece, e ainda possui uma ficha corrida, desde crimes de violência doméstica a maus-tratos ou abuso sexual, a probabilidade de reincidência é muito grande. E essa mulher, sem checar os antecedentes criminais desse parceiro, sem adquirir um duradouro tempo de convivência, coloca-o dentro de sua casa, e pior, deixando seu filho sob os cuidados desse potencial abusador, é no mínimo flertar com o perigo”.

Outro fator de risco é deixar a criança sozinha com pessoas com a qual ela não se sinta confortável. “A mãe vai trabalhar e deixa a criança sob cuidados do padrasto, de vizinhos, irmão mais velho, tio ou primos; essa conduta também é um fator de risco. É o que eu falo nas minhas palestras, nessas ações que venho desenvolvendo no estado há mais de 15 anos: a prevenção é a melhor fórmula para não se ter dores de cabeça”.

Crianças vítimas de maus-tratos podem apresentar mudanças no comportamento e, apresentar sinais. “A criança pode desenvolver um comportamento mais agressivo ou introspectiva; se deixou de usar fralda, voltando a usar; poderá vir a urinar na cama. Apresenta sinais de repulsa, pavor, no seu comportamento quando chega perto do seu agressor ou abusador, semblante de medo, a todo momento tenta se afastar do indivíduo, as vezes até chora. Por isso, é muito importante que a família tenha essa observação, fiscalização, e diante de qualquer desconfiança de abuso, redobre a atenção e procure estar mais próxima dessa criança”, destaca.

Outro ponto ao qual os responsáveis devem se atentar é quanto a obrigar crianças a terem contato físico com adultos. Para a sargento, esse incentivo, em determinados momentos, pode colocar as crianças e adolescentes ainda mais perto e reféns de seus abusadores. “E por que? Porque conforme estudos e dados estatísticos, cerca de 85% dos maus-tratos e abusos são cometidos por pessoa que está inserido dentro do seio familiar. Então um padrasto, um tio, um primo, um irmão ou até mesmo o próprio pai biológico ou um vizinho. Pessoas acima de quaisquer suspeitas”, alerta.

A orientação é para que as famílias tenham cuidado com as pessoas que colocam dentro de casa ou com quem deixam suas crianças e adolescentes. Sargento Betânia defende e cobra para a ações de prevenção e combate aos maus-tratos e abusos sejam realizados sob uma ótica Sistêmica e integrada.

Em que pilares de enfrentamento precisam ser seguidos, compartilhados e integrados, em que família e poder público exerçam plenamente suas responsabilidades e competências. Sendo que o Poder Público representado pelo executivo, Conselho Tutelar, Ministério Público, Polícia Judiciária, Polícia Militar, e o legislativo possam apresentar, fiscalizar e acompanhar para que as políticas públicas e as ações de prevenção, combate e responsabilização criminal possam ser cumpridas efetivamente e com agilidade “.

Para Sargento Betânia, é importante ter cuidado com as pessoas que entram na intimidade familiar. Foto: Bruno Barros

Há mais de 15 anos

Policial Militar há 20 anos no Mato Grosso do Sul, sargento Betânia vem há mais de uma década e meia, desenvolvendo e atuando pelo estado, com ações de prevenção, conscientização e combate ao abuso e exploração sexual. Nessa caminhada pelo estado e nos bairros de Campo Grande, deparou-se com diversas formas de violência e criminalidade. “Encontrei famílias desestruturadas, crianças desassistidas de valores éticos e morais, sofrendo abusos físicos, psicológicos e sexuais, em extrema vulnerabilidade, abandonadas a própria sorte, e ainda sem o amparo do poder público, e entendi que a minha missão não terminaria quando encerrava minha escala de serviço; porque a maior contribuição seria a posterior, iniciando minhas ações social, de conscientização, prevenção e em muitos casos orientando”, relembra.

Dessa forma, passou a atuar voluntariamente, realizando encontros e palestras de conscientização e prevenção, em escolas, igrejas, associação de moradores, empresas, como mecanismo de combate ao abuso sexual e maus-tratos infantis.

“Passei a contribuir com minha experiência adquirida ao longo desses 20 anos como policial, mas também com um olhar sensível, de força e resiliência de mulher, mãe, e defensora dos direitos das nossas crianças; Mas também, orientando e conscientizando de que ter direitos é basilar, entretanto, requer responsabilidade, disciplina, limites e valores. Onde tem a defesa da vida, o combate à violência e criminalidade, pode ter certeza que me farei presente”, finaliza

Denúncias

Denúncias de casos de crimes contra crianças e adolescentes podem ser realizadas por qualquer pessoa e de maneira anônima, a fim de garantir a segurança dos denunciantes. Quem souber desses crimes pode procurar o Conselho Tutelar, qualquer delegacia de Polícia Civil, especialmente a Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (Depca), ou o telefone 190 da Polícia Militar.

Há, ainda, o Disque 100. O serviço pode ser acessado de qualquer localidade e a qualquer hora. “É 24h esse telefone, tanto durante a semana, quanto finais de semana. Ali, com certeza, você vai ser ouvido”, pontua a sargento Betânia.

“Aqueles que procurarem algum Órgão ou Instituição responsável por acolher essa denúncia e não forem atendidos, podem procurar o Ministério Público e informar o ocorrido, solicitando providências. É um dever constitucional, tanto daqueles da Polícia Civil, Polícia Militar, Conselho Tutelar acolher as denúncias e tomar providências.

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